Olhar sereno e sorriso aberto: sinais de Missão Cumprida.
Sempre gostei de ler e conhecer testemunhos de pessoas que empenham suas vidas na dedicação aos mais pobres por meio de sua atividade profissional. Ainda bem jovem me impactou conhecer a vida de Doutor Albert Schweitzer, Raoul Follereau, Martin Luther King e Ghandi. Décadas depois, foi edificante conhecer a vida de entrega por um mundo melhor em pessoas como Desmond Mpillo Tutu (África do Sul), Madre Teresa de Calcutá (Índia) e Nelson Mandela (África do Sul).
Hoje, pelo retrovisor da história, se pode contemplar a vida de dedicação, competência e amor de um bem-sucedido médico cirurgião italiano que deixou o conforto da Europa, deixou a comodidade de uma profissão que remunera muito bem, que deixou de constituir a sua própria família para integrar-se na grande família dos mais pobres e esquecidos desse mundo. Refiro-me ao médico e missionário comboniano Giuseppe Ambrosoli.
Parece simples. E pode ser realmente simples, mas isso não significa que seja fácil. Olhar sereno e sorriso aberto num mundo tão conturbado e marcado por divisões, ódio, agressões, violência e morte. Uma vida intensamente dedicada ao “totalmente outro”, ao “totalmente diferente”. Doutor Giuseppe Ambrosoli procurou viver intensamente o relacionamento fraterno, testemunhou e viveu a fraternidade, e morreu como refugiado longe de sua missão.
Tudo poderia parecer fracasso. Não! Foi sofrido, mas não foi fracasso. O médico e sacerdote comboniano chegou à pequena missão de Kalongo (no interior de Uganda) no dia 19 de fevereiro de 1956. Depois de 31 anos de fecunda presença evangelizadora, fez sua páscoa definitiva no dia 27 de março de 1987, como refugiado na cidade de Lira – distante 124 quilômetros ao sul de Kalongo.
Deixou sua missão em Kalongo devido aos ataques terroristas de guerrilheiros que intimidaram, feriram e massacraram milhares de Ugandenses com milhares de mortes. Deixar Kalongo depois de 31 anos de dedicação foi muito doloroso para o Padre Doutor Giuseppe Ambrosoli. A dor foi muito intensa. Depois de sete meses faleceu na cidade de Lira e aí foi sepultado.
Sete anos após seu falecimento, a população de Kalongo requisitou seus restos mortais que hoje descansam em nessa terra de missão: Kalongo (Uganda). Não foi sem sofrimento, mas certamente não foi fracasso.
Em 31 anos de trabalho como médico e como missionário comboniano, padre Giuseppe Ambrosoli construiu um hospital com 370 leitos, além de uma escola de obstetrícia. Uma vida de quem soube harmonizar sua carreira profissional (médico cirurgião) com sua vocação (sacerdote missionário comboniano); soube harmonizar pregação com testemunho, bondade com competência, mãos benfazejas do sacerdócio com as mãos precisas do cirurgião, a Luz da lâmpada do Santíssimo com os focos de luz das salas de cirurgias e, acima de tudo, uma vida que soube harmonizar fé e amor concreto aos mais pobres desse mundo.
É preciso destacar alguns pontos nessa vida tão bonita, vitoriosa, dedicada e amável do Padre Doutor Giuseppe Ambrosoli que sempre privilegiou o Relacionamento amigável e cordial com todos. Pessoas extremamente pobres do interior de Uganda encontravam sempre o Padre Doutor com um sorriso cativante e acolhedor. Também seus colegas médicos e profissionais da saúde encontravam em Giuseppe Ambrosoli o homem de Deus que bem exerceu seu ministério de cuidar da vida (física e espiritual).
Com apenas 33 anos, o jovem médico e padre chegava em Kalongo dirigindo um caminhão que não sabia conduzir, mas que se adaptou rapidamente devido à exaustão de um Irmão missionário e que já não tinha mais forças para conduzir o pesado caminhão em estradas tão difíceis.
Era comum ver o padre Giuseppe Ambrosoli ser o último a se servir nas refeições, pois sempre se certificava que todos (pacientes e profissionais do hospital) tivessem o suficiente para se alimentar.
Quando andava pelas ruas de Kalongo ou em vilarejos vizinhos, seu Jeep era como “coração de mãe!”: sempre cabia mais um. Andava pelas ruas e vilarejos procurando mães (ou mulheres grávidas) que não conseguiam chegar até ao hospital.
Mesmo exausto pelo trabalho e pelas longas caminhadas em busca de doentes que não conseguiam chegar ao hospital, o Doutor Ambrosoli não se recolhia para repousar sem, antes, vistoriar todos os leitos, cobrindo carinhosamente cada pobre acolhido em seu hospital.
Também era comum, depois de todo esse sacrifício diário, vê-lo lavando as próprias meias para usá-las assim que estivessem devidamente secas.
Terminado o dia, um tempo ainda com Jesus Eucarístico. A oração o alimentava e o fortalecia. Depois, algumas horas de repouso para retomar sua dedicação na missão, tão logo aparecessem os primeiros raios da luz do novo dia.
Assim viveu Padre Doutor Giuseppe Ambrosoli: um irmão, um pai, um médico cirurgião, um professor, alguém que via nas pessoas mais simples e humildes, a dignidade de serem filhos e filhas de Deus.
Além do relacionamento cordial e fraterno, algumas virtudes precisam ser postas como exemplo de vida que nos deixa o padre Giuseppe Ambrosoli:
a) Coragem: Não era homem de aceitar a exploração e a opressão tão comuns em tantos momentos de convulsões políticas em Uganda. Enfrentava com a mesma coragem a ação nefasta de clérigos profissionais e burocratas, políticos vingativos e militares indisciplinados, rebeldes agressivos;
b) Humildade: Poderia ser um homem rico, um cirurgião famoso na Itália, mas optou pela vida simples no meio de um povo pobre no coração da África. Poderia ter sido um homem muito rico. Preferiu a vida simples e pobre no meio dos mais pobres. Preferiu servir a ser servido. Lavava as próprias meias. Mas, era muito feliz.
c) Autocontrole: Sempre com um sorriso sereno, cheio de bondade, humanidade, amor, misericórdia e compreensão nas limitações das pessoas;
d) Compromisso com seu dever: o cansaço não o abatia. Tinha forte consciência de seu dever e de seu compromisso com a vida e o bem-estar de seus pacientes;
e) Generosidade: Todas as horas de estudo dedicadas nas faculdades de medicina e de teologia, bem como as demais horas dedicadas em diversos estudos, foram colocadas gratuitamente ao dispor de pobres agricultores, de mães abandonadas, de um povo esquecido, no coração da África. Ele ofertou sua vida, suas habilidades, seus conhecimentos, sem nada cobrar… gratuitamente.
Padre Giuseppe Ambrosoli. Doutor Giuseppe Ambrosili. Missão cumprida. E muito bem cumprida. Por isso, esse olhar sereno e esse sorriso aberto. Sua vida valeu a pena.
Padre Giuseppe Ambrosoli. Doutor Giuseppe Ambrosili. Testemunho e exemplo a ser seguido por cristãos de todas as denominações. Por isso, será beatificado em Kalongo – Uganda – no dia 20 de novembro de 2022.
Padre Giuseppe Ambrosoli: Intercedei por nós.
José Archângelo Depizzol
16/11/2022
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