Um caminho estreito: Onde colocamos nossa confiança?
31 Julho 2022 – ANO C – 18º DOMINGO DO TEMPO COMUM
Leituras:
Ecl 1,2.2,21-23
Sl 89(90),3-4.5-6.12-13.14 e 17 (R. 1)
Cl 3,1-5.9-11
Lc 12,13-21
PRIMEIRA LEITURA
Que resta ao homem de todos os seus trabalhos?
Leitura do Livro do Eclesiastes 1,2; 2,21-23
2 “Vaidade das vaidades, diz o Eclesiastes, vaidade das vaidades! Tudo é vaidade”. 2,21 Por exemplo: um homem que trabalhou com inteligência, competência e sucesso, vê-se obrigado a deixar tudo em herança a outro que em nada colaborou. Também isso é vaidade e grande desgraça. 22 De fato, que resta ao homem de todos os trabalhos e preocupações que o desgastam debaixo do sol? 23 Toda a sua vida é sofrimento, sua ocupação, um tormento. Nem mesmo de noite repousa o seu coração. Também isso é vaidade.
Salmo Responsorial: Sl 89(90), 3-4.5-6.12-13.14.17
R. Vós fostes ó Senhor, um refúgio para nós.
3 Vós fazeis voltar ao pó todo mortal, quando dizeis: “Voltai ao pó, filhos de Adão!”
4 Pois mil anos para vós são como ontem, qual vigília de uma noite que passou.
5 Eles passam como o sono da manhã, 6 são iguais à erva verde pelos campos: De manhã ela floresce vicejante, mas à tarde é cortada e logo seca.
12 Ensinai-nos a contar os nossos dias, e dai ao nosso coração sabedoria! 13 Senhor, voltai-vos! Até quando tardareis? Tende piedade e compaixão de vossos servos!
14 Saciai-nos de manhã com vosso amor, e exultaremos de alegria todo o dia! 17 Que a bondade do Senhor e nosso Deus repouse sobre nós e nos conduza! Tornai fecundo, ó Senhor, nosso trabalho.
SEGUNDA LEITURA
Esforçai-vos por alcançar as coisas do alto, onde está Cristo.
Leitura da Carta de São Paulo aos Colossenses 3,1-5.9-11
Irmãos: 1 Se ressuscitastes com Cristo, esforçai-vos por alcançar as coisas do alto, onde está Cristo, sentado à direita de Deus; 2 aspirai às coisas celestes e não às coisas terrestres. 3 Pois vós morrestes, e a vossa vida está escondida, com Cristo, em Deus. 4 Quando Cristo, vossa vida, aparecer em seu triunfo, então vós aparecereis também com ele, revestidos de glória. 5 Portanto, fazei morrer o que em vós pertence à terra: imoralidade, impureza, paixão, maus desejos e a cobiça, que é idolatria. 9 Não mintais uns aos outros. Já vos despojastes do homem velho e da sua maneira de agir 10 e vos revestistes do homem novo, que se renova segundo a imagem do seu Criador, em ordem ao conhecimento. 11 Aí não se faz distinção entre grego e judeu, circunciso e incircunciso, inculto, selvagem, escravo e livre, mas Cristo é tudo em todos.
EVANGELHO
E para quem ficará o que tu acumulaste?
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Lucas 12,13-21
Naquele tempo, 13 Alguém, do meio da multidão, disse a Jesus: “Mestre, dize ao meu irmão que reparta a herança comigo”. 14 Jesus respondeu: “Homem, quem me encarregou de julgar ou de dividir vossos bens?” 15 E disse-lhes: “Atenção! Tomai cuidado contra todo tipo de ganância, porque, mesmo que alguém tenha muitas coisas, a vida de um homem não consiste na abundância de bens”. 16 E contou-lhes uma parábola: “A terra de um homem rico deu uma grande colheita. 17 Ele pensava consigo mesmo: ‘O que vou fazer? Não tenho onde guardar minha colheita’. 18 Então resolveu: ‘Já sei o que fazer! Vou derrubar meus celeiros e construir maiores; neles vou guardar todo o meu trigo, junto com os meus bens. 19 Então poderei dizer a mim mesmo: Meu caro, tu tens uma boa reserva para muitos anos. Descansa, come, bebe, aproveita!’ 20 Mas Deus lhe disse: ‘Louco! Ainda nesta noite, pedirão de volta a tua vida. E para quem ficará o que tu acumulaste?’ 21 Assim acontece com quem ajunta tesouros para si mesmo, mas não é rico diante de Deus”.
O Reino de Deus e os bens deste mundo. Qual é a dor? Onde dói? O que é preciso fazer?
A Palavra de Deus é Luz. Ilumina o caminho. As pessoas que se aproximam de Jesus devem também se transformar em sinalizadores, em luz para seus irmãos: “vocês são a Luz do mundo” (Mateus 5,14). Em que as leituras de hoje podem iluminar a nossa vida? Elas nos fazem refletir sobre a nossa relação com os bens materiais. Alguns pontos precisam ser destacados, pois sinalizam caminhos seguros (embora estreitos) de nosso seguimento a Jesus e a seu Projeto do Reino de Deus. Vejamos algumas pistas.
a) Qual é o sentido de nossa vida? A partir do texto sugerido na primeira leitura, extraímos a evidência da incapacidade de o homem encontrar uma saída, um sentido para a sua vida por meio de suas próprias forças e habilidades. Isso nos leva a reconhecer a nossa impotência e sentir o gosto amargo de uma vida sem sentido, sem sabor e sem saber, quando a centramos apenas nos valores humanos e nos valores materiais.
A primeira recomendação para a prática cristã é reconhecer a fugacidade dos bens materiais. Por maiores que sejam nossas riquezas elas são incapazes de dar sentido, de dar alegria verdadeira, de dar felicidade e “salvação” à nossa vida. É preciso colocar nossa confiança e nossa esperança em Deus. Só Deus é capaz de dar sentido à nossa existência.
b) Libertar-se da cobiça e do apego aos bens materiais. Seguir Jesus é renunciar tudo aquilo que Jesus rejeitou como diabólicos (Lucas 4, 1-13), ou seja, renunciar a todo mecanismo gerador de egoísmo, ambição, injustiça, orgulho, ganância e morte. Seguir Jesus é, acima de tudo, escolher e acolher uma vida de doação, de entrega, de serviço, de amor. Do Lava Pés (João 13, 1-17) ao Gólgota, Jesus vivenciou com radicalidade a doação, a partilha, a entrega, o serviço e o amor incondicional. Seguir Jesus é fazer as mesmas opções de Jesus, mesmo que isso possa levar à cruz, que é a garantia da ressurreição. Daí, o questionamento fundamental para o discípulo de Jesus: Em nossas vidas há uma opção clara pelas “coisas do alto”?
Na segunda leitura, Paulo sinaliza que “buscar as coisas do alto” significa ser nova criatura, ou seja, não se deixar escravizar pelas coisas deste mundo, mas permitir que o Cristo, com todas as suas escolhas, resplandeça em nós. Jesus não denuncia a busca dos bens materiais necessários para uma vida digna, mas denuncia a escravidão do homem que faz dos bens materiais o seu ídolo e, assim, descarta o verdadeiro Deus.
A segunda recomendação para a prática cristã volta-se para a liberdade, para a bênção e para o bom uso do dinheiro e dos bens materiais: ser livre e não escravo dos bens desse mundo. Uma vida voltada apenas para o acúmulo de bens materiais é uma vida fadada ao fracasso, à falência de sentido e de verdadeira realização. É insensato e inútil todo esforço humano em trabalhar exaustivamente apenas para ajuntar riquezas e, depois, não poder usufruir, deixando para quem nunca trabalhou aproveitar-se de seus tesouros, bens e riquezas: Insensatez e vaidade, diz a primeira leitura.
c) Os bens materiais como fonte e ponte relacional de solidariedade e amor. Jesus não é contra o uso e a posse dos bens materiais. Toda obra da criação foi feita pelo amor de Deus e para o bem de seus filhos e filhas. O que Jesus pretende dizer é que não podemos viver na escravidão do dinheiro e dos bens materiais, como se eles fossem “a única” coisa importante da nossa vida. Essa preocupação excessiva pelo acúmulo de riquezas se transforma numa experiência de egoísmo, de fechamento, de desumanização. Quando o coração do homem é tomado pela cobiça, pela avareza, pelo egoísmo, quando a vida se torna um combate obsessivo pelo “ter mais e sempre mais”, o homem torna-se insensível aos outros e a Deus. Neste estágio, o homem se torna capaz de explorar, de escravizar o irmão, de cometer injustiças, de matar com o objetivo de ampliar suas riquezas.
O caráter demoníaco desse estágio faz do homem um ser orgulhoso e autossuficiente, incapaz de amar, de partilhar, de se preocupar com os outros. Não há lugar para a partilha e a solidariedade nesse coração. Não há lugar nem mesmo para Deus, pois seu coração está cheio do ídolo da riqueza e do poder.
A terceira recomendação para a prática cristã não é proferida por mim e nem fruto dessas reflexões. Acolho, torno pública e recomendo a admoestação proferida pelo próprio Jesus: “Atenção! Tomai cuidado contra todo tipo de ganância, porque, mesmo que alguém tenha muitas coisas, a vida de um homem não consiste na abundância de bens” (Lucas 12,15).
Que o Espírito Santo nos dê a sabedoria, o discernimento, a harmonia e o equilíbrio para que possamos manter uma relação com os bens deste mundo dentro da perspectiva do Reino anunciado e vivido por Jesus.
31/07/2022
José Archângelo Depizzol
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